CONFEDERAÇÃO DO DESPORTO DE PORTUGAL


A quarta edição da rubrica “CDP Entrevista…” decorreu na quarta-feira como habitualmente e teve como tema “a importância de uma Rede Colaborativa”. Neste debate, estiveram presentes Ricardo José, membro da direção da CDP, Tomaz Morais, diretor da formação da Academia do Sporting Clube de Portugal, Vasco Rodrigues, presidente da Federação de Triatlo Portugal e Gonçalo Lobo, diretor na área da Saúde.

Na sua primeira intervenção, Ricardo José começa por falar da Rede Colaborativa, explicando que é um projeto dentro da Confederação Do Desporto de Portugal que “tem como missão colocar o desporto na agenda política, através da colaboração de várias entidades” uma vez que, “muitas das questões e dos problemas prendem-se com falta de uma boa comunicação e de decifrar muito bem a linguagem que estamos a falar, portanto entre diferentes stakeholders e diferentes players dentro da área do desporto, nem sempre conseguimos falar a mesma linguagem, de uma forma percetível, que possa criar soluções que todos necessitamos”. Por outro lado, acrescenta Ricardo José a Rede Colaborativa, pretende “ligar quem legisla, quem fiscaliza e quem está no terreno. Portanto a Confederação tem como grande objetivo (…) tentar juntar estas três áreas que tem influência na ação do desporto, em particular em Portugal, e conseguir esbater os problemas ou as questões de comunicação que existem entre estes três patamares” para que se possa obter “boas soluções, soluções rápidas e eficazes e que ajudem o desporto a crescer e que permita que o desporto se possa desenvolver de uma forma sólida e sustentável.”

Tomaz Morais afirma que “trabalhar em rede é uma réplica muito clara daquilo que é saber estar em equipa, saber trabalhar em equipa”, e explica que coaching “prepara as pessoas para esse tipo de trabalho. No fundo, dá-lhes um conjunto de ferramentas para que elas possam ter a capacidade de, no seu dia-a-dia, alimentar esta rede, fomentar esta rede e valorizar esta rede.”

Apesar do triatlo ser uma modalidade individual, Vasco Rodrigues refere que “temos mais facilidade para perceber o que é necessário para trabalhar em equipa e o desporto acaba por ser um facilitador desse processo”. Na sua opinião “o grande desafio que o desporto neste momento atravessa tem a ver precisamente com a capacidade que nós temos de trabalhar em rede, mas com outras federações, com outras entidades “. O que sente enquanto dirigente da Federação de Triatlo é que “acaba por ser consumido dentro da própria modalidade e temos uma grande dificuldade em criar relações e criar pontes com outras federações ou com outros clubes ou com outras entidades”. E tal como acontece em quase todas as áreas sociais, “o dinheiro não é suficiente (…) e quando nós não temos capacidade de otimizar esse dinheiro e de otimizar parte desses recursos, torna-se ainda mais difícil gerir as modalidades. Portanto eu estou seriamente convencido que no dia em que as federações puderem partilhar contabilidades ou recursos humanos (…) nós estaremos em condições de garantir mais oportunidades para as diferentes modalidades e para o desporto em geral”.

Já Gonçalo Lobo, focado na área da saúde e da ação social, afirma que “trabalhar em rede veio colmatar algo que estava muito em voga que era dividir para reinar e o trabalhar em rede veio exatamente contrabalançar este movimento que era fragmentar tudo, tanto no âmbito social como na saúde e rapidamente percebemos que quando estamos perante uma pessoa, uma pessoa não é educação, uma pessoa não é saúde, uma pessoa não é ação social (…) por isso quando trabalhamos com as pessoas e para as pessoas, como o desporto faz, temos que integrar isto tudo e não podemos dividir”. Mas embora tenha aspetos positivos, na sua experiência, “trabalhar em rede não é fácil, até porque em Portugal temos muito esta cultura de que se eu tenho uma ideia, então ela é minha, e se eu vou partilhar, vão roubar-me esta ideia ou vão tirar proveito desta ideia (…) mas daquilo que é a minha experiência, do ponto de vista tanto dos financiamentos nacionais como internacionais, é sempre bom e sempre melhor, nós partilharmos esta ideia com outras pessoas, até porque os financiadores tanto por parte internacional, europeus e como a nível nacional, há cada vez uma maior majoração para as parcerias e para os projetos que são apresentados de forma conjunta entre várias entidades.”

Ricardo José ressalva que “grande parte das federações trabalha com muitos voluntários, com grandes responsabilidades e que têm acima de tudo de cumprir uma função tão profissional como alguém que é pago para a fazer.”

No que diz respeito às dificuldades que enfrenta ao trabalhar em rede, Vasco Rodrigues salienta a questão do voluntariado. “Eu penso que este sistema desportivo nas federações está um bocadinho obsoleto” e argumenta utilizando um exemplo proveniente dos Estados Unidos “esta questão dos CEOs e de uma direção empresarial é fundamental no universo desportivo e no universo federativo. Aquilo que acontece hoje em dia é que os presidentes de federações e as direções que neste momento acumulam se calhar 80% do trabalho da maioria das federações e (…) acumulam 95% das ideias e das diretrizes de trabalho das federações, são rotativos a cada quatro anos (…) mas a realidade é que tudo isto funciona tudo num ponto de vista político (…) e eu acho que a maioria dos técnicos das diferentes federações não se conhecem, não interagem e no fundo, são esses que estão cá diariamente (…). Não sendo as nossas profissões, não sendo o dinheiro, o pão que nós metemos em casa todos os dias, eventualmente podemos perder aqui um bocadinho o ânimo ou não ter a força necessária e, portanto, eu acho absolutamente fundamental que nós percamos, ou progressivamente venhamos a perder este ritmo e esta condição de voluntário, porque não é isso que nós precisamos.”

Considera ainda, que seria muito mais fácil “do ponto de vista económico, ter uma casa ou um prédio com dez andares, onde estivessem todas as federações. As federações iam pagar menos, iam estar todas juntas e muito mais facilmente se iam conhecer e trabalhar”.

Tomaz Morais reforça a intervenção do Vasco, afirmando que “há muitas sinergias que podiam ser criadas com outras federações e que não são, e que a determinado momento, o sentimento que temos é que as federações se completem entre si, porque nós sabemos que o associativismo é difícil, os fundos de financiamento são cada vez mais complicados hoje em dia e os patrocínios que podem (…) na verdade criar uma relação comercial com uma federação são cada vez menos, e mais difíceis (…) e nós não nos desenvolvemos mais, porque muitas vezes trabalhamos sozinhos, não temos esta capacidade de trabalhar em rede (…) e no fundo temos uma postura muito de que nos é devido e não o que nós temos de fazer”.

Por fim, todos os intervenientes deixaram a sua mensagem. Vasco Rodrigues começou por dizer que “todos os grandes problemas são simultaneamente oportunidades e a pandemia está a ter e terá consequências brutais na realidade desportiva”. E afirma que acredita “que a única solução para o problema que nós vamos enfrentar nos próximos, se calhar 5, 6, 10 anos será um programa efetivo de valorização dos desportos, ou do desporto em si, em que as famílias e os professores e os próprios atletas percebam que não pode ser o clube a pagar os equipamentos desportivos, que não pode ser o clube a pagar as inscrições em prova, que não pode ser o clube a pagar os treinadores dos filhos e portanto, se nós quando vamos ao cinema pagamos e não pagamos tão pouco quanto isso, acho que temos todos que perceber que o desporto tem um valor muito transcendente e que nós não vamos lá só deixar os nossos filhos para eles terem mais um bocadinho de atividade e nós pudemos ir para a praia.” Finaliza dizendo que “o desporto tem todos os valores culturais, sociais, de saúde e afins, nós federações desportivas e todos os outros agentes que gravitam em torno do desporto, acho que temos a responsabilidade de desenvolver uma rede colaborativa rápida de promoção social do desporto”.

Na sua mensagem Gonçalo Lobo deixa um desafio: “permitam-se ir em frente” e continua dizendo que “foram apontadas aqui uma série de soluções, nomeadamente a partilha de recursos humanos, a partilha de espaços físicos, se isto não acontecer, vocês nunca vão saber se vai resultar ou não, por isso permitam-se, sejam audazes e realmente avancem com essas soluções porque efetivamente têm um retorno financeiro”.

Na sua mensagem final, Tomaz Morais constata que existiu “uma evidência clara que foi a forma como o desporto, uma vez mais, e quando falo do desporto, falo no desporto formal e falo na atividade física desportiva, que são duas coisas distintas. A forma como os profissionais dessa área e não só, muitos voluntários, conseguiram manter atletas em treino, teletreino (…) e a cumprirem um programa. Acho que a criatividade que o desporto tem demonstrado ao longo da sua história, a capacidade de inovação e o facto de ser realmente diferente (…) acredito que o desporto pode sair muito forte nisto, sem dúvida nenhuma, mas vai ter que ser muito criativo e (…) não dá para continuar como era, a trabalhar cada um por si.”

Por fim, Ricardo José deixa a mensagem de que “existem um conjunto de instituições, de diferentes níveis e de diferentes escalas, que têm responsabilidades e que procuram, com as pessoas que lá estão (…) de uma forma mais profissionalizada, ou menos, procuram fazer o melhor que sabem e precisam de ajuda, precisam de uma visão de fora, às vezes, uma visão externa mais clara de quem está a olhar de fora e a ver aquilo que quem está absorvido por aquelas questões todas, por aqueles problemas, não consegue ver logo… mas a mensagem que vamos passar para conseguir alterar e melhorar esses processos que ali estão a acontecer, tem de ser construtiva, tem de ser clara, tem de ser positiva, porque se nós formos fazer um ataque a essas pessoas, se tivermos uma abordagem negativa, as pessoas vão ter dificuldade em ouvir e aceitar e em construir a partir daí”. Conclui assim, dizendo ser isso que “tem de mudar entre nós todos, é conseguirmos ter uma abordagem, positiva, crítica, mas positiva, crítica, mas construtiva, para que estejamos todos disponíveis para colaborar e participar dessas novas ideias e dessas novas visões”.

Para a semana voltamos a ter um novo debate, como sempre à quarta-feira, dia 29, pelas 19h, em direto, no facebook da Confederação do Desporto de Portugal.

Fonte: CDP, 23/07/2020

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